No livro "Abraço" do José Luís Peixoto li um texto sobre uma cabine telefónica. Aqui fica o excerto de quando o Zé Luís, como lhe chamava a avó, era pequeno:
"Mesmo muitos anos depois de ter sido instalada, a cabine telefónica não tinha qualquer risco ou sujidade. Aquele era um lugar que todas as pessoas da terra estimavam, como poderiam estimar um relógio antigo, ou qualquer objecto precioso. Muitas vezes de manhã, ao passar pelo terreiro, vi mulheres que moravam perto da cabine telefónica a lavá-la. Utilizavam água, que despejavam e que escorria, suja, ao longo das regadeiras. Utilizavam líquido dos vidros, que esfregavam com folhas de jornal. Nas outras ruas da vila, era exactamente assim que acontecia também com os caixotes do lixo. As pessoas que moravam perto dividiam entre si os dias em que os lavavam com vassouras, com baldes cheios de água. Depois viravam-nos ao contrário para secarem".
Acho que é disto que temos falta, do sentimento de bem comum, de responsabilidade sobre as coisas que são de todos e não são de ninguém. Ainda há uns dias, em conversa indignada com os meus pais sobre um rapaz que deitou um papel para o chão, estando ao lado de um adulto que nada fez, comentava o meu pai que os seus alunos (crianças!) se virem um casaco no chão, deixam ficar. "Não é meu!" é a resposta. E ainda por cima são perfeitamente capazes de lhe passar por cima. Afinal, não é deles!
Volta e meia procuro aplicações de produtividade e gestão de tarefas. Sou totalmente pessoa do papel e caneta e às vezes até me pergunto porque me dou a esse trabalho, mas que hei-de eu fazer… Acho que de alguma forma essas aplicações até me ajudam a melhorar o meu sistema “analógico”.
Pois bem, a minha última descoberta veio através do livro Não leias este livro. O autor criou uma aplicação baseada no que fala no livro e que nos obriga a escolher o que vamos fazer. Chama-se To don’t list e só nos permite ter 3 coisas na lista de tarefas enquanto todas as outras vão sendo registadas na lista de coisas a não fazer. Parece complicado mas não é.
A questão é que, na maioria das vezes, a nossa lista de coisas a fazer começa a crescer de tal maneira que perdemos o foco. As três coisas mais importantes desaparecem nessa imensidão de linhas escritas e acabamos por, muitas vezes, cumprir as menos importantes.
No outro dia dei por mim a pensar em como ficaria a lista das coisas que quero fazer nas férias se a colocasse nesta app. Quais seriam as 3 coisas mais importantes e quais ficariam na to don’t list…
As férias são tempo de descanso, de diversão, de descoberta de novos sabores, novos lugares e também podem ser tempo para novos hábitos.
Há uns anos queria deixar de beber meias de leite. Foi até um dos pontos da minha lista! Aproveitei as férias para perder esse hábito que sentia que me fazia menos bem e me começava a deixar desconfortável.
Podemos aproveitar os períodos que nos tiram das rotinas quer para perder hábitos, quer para ganhar! Não estamos stressados, quase não temos horários nem pressões, podemos usufruir dos nossos dias de forma muito mais tranquila, o que nos vai permitir “viver” melhor.
Há vários estudos e teorias sobre a formação de hábitos. Durante quantos dias devemos repetir uma ação para que se transforme num hábito, estratégias e técnicas de compensação para que nos motivemos a isso, etc.
Eu acredito que há uma fórmula quase mágica para que isto aconteça. Em primeiro lugar precisamos saber o que queremos fazer ou deixar de fazer e o porquê. Depois de termos isso definido, acredito que funcionará melhor se fizermos associações com hábitos ou práticas que já tenhamos. E depois, definir uma espécie de regra e formulá-la numa frase: quando chegar a casa, vou descalçar os sapatos e calçar os chinelos à entrada; quando for lavar os dentes, limpo, tonifico e hidrato a pele; sempre que pensar em beber uma coca-cola peço uma água com gás ou uma garrafa de água, quando me deitar vou pousar o telefone longe da cama. Estão a ver o estilo.
Talvez ajude se pensarmos “quando, onde e como” será melhor pôr em prática o tal hábito ou rotina. Assim como ajudará se dividirmos um grande objetivo em pequenos passos. Por exemplo: se eu quero escrever um livro, em vez de pensar em escrever um capítulo por dia, mais vale pensar em escrever 2 páginas ou 3 de cada vez. Um capítulo pode ser impossível mas 2 ou 3 páginas… Uns dias posso até escrever mais páginas que outros.
Atrás dei o exemplo de um hábito que eu queria perder, o das meias de leite, mas podia ter dado outros para ganhar. Escrever, ler antes de dormir, correr, ir à ginástica, evitar os doces, pôr creme hidratante… tantos exemplos!
É importante que, quando queremos ganhar um hábito, tornemos a experiência visível, atrativa, relativamente fácil e que nos traga satisfação. Claro que, se queremos perder um hábito podemos fazer um misto entre estas premissas e os seus opostos!
E quando falhamos, ou quando não cumprimos um ou outro dia? Bem, todos os dias são bons para começar, e todos são melhores para recomeçar! Quando falhamos um dia voltamos a pôr em prática no dia seguinte. É isso que vai fazer a diferença!
P.S.: muitas vezes o nosso maior obstáculo somos nós mesmos, se falhamos um dia achamos que não iremos conseguir. O conjunto das vezes que conseguimos é que vai contribuir para aquilo que queremos alcançar!
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