Adornos dourados e pormenores delicados
Mudou a hora e por isso já era de noite. As pessoas abrigavam-se da chuva mas ninguém se sentava no banco da paragem do autocarro. Estava ocupado.
A rapariga dos óculos redondos e de massa preta mexia nos sacos vermelhos que ocupavam o tal banco. Tirava e voltava a guardar dentro dos sacos um tesouro acabado de descobrir. Não sei de onde os trouxe, quem lhos deu ou se os comprou, mas até eu estava entusiasmada. E ela sorria.
A cada par que tirava dos sacos, sorria. Sorria e riam também os olhos por detrás daqueles óculos tão caricatos.
Tal como os sacos, eles também eram vermelhos. Adornos dourados e pormenores delicados. Capa dura e encadernação bonita, vermelha com arabescos dourados na lombada e um pequeno quadrado preto onde ela lia os títulos pela primeira vez. E sorria sempre!
Para a maioria das pessoas eram apenas dois sacos vermelhos cheios de livros velhos. Para ela, e a avaliar pelo cuidado com que lhes pegava, pelo entusiasmo com que lia cada lombada e pela atenção no virar de cada página durante a viagem, para ela, eram um tesouro. De certeza que eles foram o melhor do seu dia!